quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Luta solitária em busca de uma pátria melhor para todos.

Irom Sharmila protesta contra uma lei
 que dá direitos excepcionais a forças armadas

Neste janeiro, alguns indianos farão uma pausa para pensar sobre o extraordinário poder de uma mulher que se recusa a comer, afirma a historiadora feminista Uma Chakravarti. Mas entender o protesto pode ser a chave para compreender muito do que aflige a Índia.
Que definição de Estado, país e da sociedade em que vive pode ser mais determinante para uma mulher do que ser presa simplesmente por se recusar a comer?
Embora poucos indianos pareçam estar preocupados com o destino de Irom Sharmila Chanu, para mim ela é uma mulher que representa um conjunto essencial de valores.
Sharmila iniciou sua greve de fome em 2000 para protestar contra uma lei controversa no estado nororeste de Manipur, que deu às Forças Armadas indianas amplos poderes. Esses poderes permitiram que eles prendessem pessoas sem mandados e até mesmo atirassem para matar em determinadas situações.
O Estado distante tem sido muito afetado pela violência insurgente, e rebeldes separatistas veem a Índia como uma potência colonial. Os rebeldes certamente foram responsáveis por mortes. Mas essa lei, ela argumenta, trata de forma efetiva uma parte da Índia como uma zona de guerra.
Ela foi presa logo após o início de seu protesto e forçada a se alimentar através de um tubo introduzido pelo seu nariz enquanto estava sob custódia em um hospital por 14 anos. No ano passado, um tribunal rejeitou a acusação por "tentativa de cometer suicídio" e ordenou sua libertação, mas ela foi novamente detida pouco depois.
Ativista tem sido presa e solta todos os anos
Todo mês de janeiro o ritual legal da sua detenção e soltura é realizado. Aconteceu de novo esta semana.
Ele é mencionado nas notícias e rapidamente esquecido. Mas eu não vou esquecê-lo, ainda mais após conhecer sua mãe, em novembro de 2010.
Mãe
A simplicidade e tristeza de sua mãe reforçou, para mim, o quanto a situação é trágica. Foi isso que ela me disse:
"Um dia eu estava sentada ouvindo as notícias e uma autoridade disse que eles nunca iriam anular a lei que dá poderes especias às Forças Armadas. Naquele dia eu me senti muito triste e deprimida. Eu disse a mim mesma: isso significa que minha filha nunca vai comer."
Para mim esta mulher é um ícone. Uma mãe que não vai ver sua filha porque sabe que vai chorar e não quer que a determinação de sua filha seja abalada.
Irom Sharmila é uma mulher que defende uma forma diferente de organizar o mundo e atua em sua retórica. Seu protesto - para mim - é incrível em sua simplicidade e sua coragem.
Ela prefere ser privada dos princípios básicos na vida do que reconhecer o sistema sob o qual ela vive. O Estado acha que não há crise, porque eles são a força que a alimenta e a mantém viva.
Mas seu corpo está sendo sustentado através da injeção de um líquido e todos sabem que isso não é vida. Ela tornou-se a personificação do princípio pelo qual está lutando. Os seres humanos não devem viver dessa maneira, assim como eles não devem ser forçados a viver sob os poderes especiais das Forças Armadas - este é seu ponto.
Ela está usando seu corpo para chamar a atenção sobre o sistema: se você se entrega a um sistema como este, você realmente desiste da base da existência humana, o direito de estar seguro e livre no seu próprio país.
Mas o corpo feminino é dispensável? O governo mal tem prestado atenção ao protesto e, na minha opinião, sua luta destaca nosso sistema distorcido de governança.
Mulher
A mídia pega pesado sobre a questão da segurança das mulheres nas ruas; houve uma batalha para as mulheres recuperarem as ruas para terem direitos iguais em espaços públicos.
Mas se as mulheres fossem consideradas objeto de igual atenção, nenhuma forma de violência seria tolerada - o debate não teria sequer sido feito.
Se os homens fossem submetidos à violência dia após dia fora de suas casas, haveria mudança; toda a noção de como vivemos e como somos governados mudaria.
Governança não está relacionada apenas a negócios internacionais e exploração dos recursos nacionais; ele também deve ser sobre segurança das mulheres em suas casas, nas ruas, nos campos e nas fábricas, nos escritórios, escolas e faculdades, e nas fronteiras - em todos os lugares onde eles precisam estar e a qualquer momento.
Olhe para as mortes por esterilização - 11 mulheres morreram em um dia por operações mal feitas. O que deu errado? O Estado fala sobre como as drogas foram contaminados ou como muitas cirurgias foram realizadas em um único dia. Mas ninguém está falando sobre as noções básicas de cuidados de saúde; sobre por que uma ligação de trompas é a única resposta para a pergunta.
As autoridades se sentem livres para promover um programa de esterilização em massa que incide sobre o corpo das mulheres. Isso traz a discussão de volta para Irom Sharmila: a questão do direito de uma mulher a seu próprio corpo, e o direito de fazê-lo um local de protesto.

Ela é criminalizada por fazer exatamente isso.

Via: Uol

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